Posição da CDU sobre as acções de despejo efectuadas pelo Município do Porto
De acordo com os relatórios de actividades da Empresa Municipal Domus Social, que gere o património habitacional da Câmara Municipal do Porto, em 2007 foram efectuados 112 despejos e, durante o 1º semestre de 2008, foram efectuados 129, “o que representa uma média de 1,1 despejo/dia” (Relatório do Conselho de Administração e Contas do Primeiro Semestre de 2008. Verifica-se, assim, um crescimento exponencial das acções de despejo nos bairros municipais, situação que importa analisar, até pelas consequências sociais e económicas que provoca.
A CDU – Coligação Democrática Unitária da Cidade do Porto considera que é fundamental que a gestão do parque habitacional social seja feita com o rigor que a existência de milhares de famílias a viverem em casas privadas com condições de habitabilidade degradante exige. No entanto, considera também que a opção pelos despejos deve ser, sempre, a última das opções, designadamente quando os mesmos são motivados por incumprimento no pagamento de rendas, particularmente numa situação de crise social que faz com que, efectivamente, muitas famílias tenham carências económicas muito graves. Por outro lado, e depois de anos e anos de laxismo no processo de cobrança das rendas, não é possível recuperar dívidas acumuladas de milhares de euros (valores que resultam mais dos juros de mora e das custas judiciais do que das rendas propriamente ditas) em prazos curtos, fazendo com que, objectivamente, seja impossível às famílias honrarem os seus compromissos.
Por outro lado, a realização de uma acção de despejo deve ter em conta as consequências sociais do mesmo, bem como os custos que acarreta para o erário público. Um recente exemplo de uma acção de despejo de uma família do Bairro de Ramalde, relatada numa sessão pública da Câmara, ajuda a entender a insensibilidade social e a irracionalidade económica que tem presidido a uma parte significativa dos despejos executados pela maioria PSD/CDS na Câmara Municipal do Porto:
Uma família residente neste bairro há quase 30 anos (ou seja, ocupou a casa desde o início da sua entrada em funcionamento), cuja arrendatária é uma Munícipe com mais de 70 anos, deixou acumular uma dívida de 3.267,80 euros (dos quais 2.126,73 de rendas e 1.141,07 de juros e custas judiciais), sendo que a totalidade da mesma diz respeito a anos anteriores a Maio de 2002 – o que significa que há mais de 6 anos que cumpre o pagamento da renda mensal. Com vergonha de comunicar a dívida à família, a arrendatária escondeu o processo e os avisos referentes à acção de despejo, tendo o mesmo sido executado no dia 17 de Junho de 2008. Nesse mesmo dia, e quando a família da Munícipe se apercebeu da situação, quotizou-se com o objectivo de pagar a dívida e evitar a acção de despejo. Não tendo tal sido aceite, o despejo consumou-se, tendo a família pago a totalidade da dívida no dia 19 de Junho. Não obstante esta situação, a maioria PSD/CDS não permitiu a reocupação da casa (que se encontra, desde essa altura, ou seja, há quase 4 meses, desocupada), num acto que demonstra uma profunda insensibilidade social – refira-se que, juntamente com a Munícipe, foram despejados uma filha desta e quatro netos, dois com 15 e 20 anos e duas com 16 anos.
Realojada pela Emergência Social (departamento da Segurança Social que assume os realojamentos em casos de despejo ou de desalojamentos por acidentes – incêndios, derrocadas, cheias, etc), esta família ocupou, inicialmente, três quartos de uma pensão, pelos quais eram pagos, com dinheiros públicos, 25€/quarto/dia, ou seja, 75€/dia! Dado que a pensão não oferecia condições mínimas de habitabilidade, a família, em conjunto com a Segurança Social, encontrou uma casa, com acesso a cozinha e quarto de banho independente, onde passou a pagar uma diária de 50€. Consciente de que as condições não eram as melhores e o custo continuava a ser muito elevado, optou-se pelo aluguer de uma casa, no mercado privado, pelo qual se paga uma renda de 400€/mês, dos quais 200€ são pagos pela Segurança Social.
Ou seja, uma situação que passou do recebimento, por parte da Câmara, de uma receita de 34,59€/mês, para uma despesa, paga pela Segurança Social, de 200€/mês (mantendo-se a casa municipal desocupada, a aguardar obras, apesar do seu bom estado).
Esta é uma situação que demonstra a irracionalidade económica (para além da insensibilidade social) na gestão dos dinheiros públicos, na medida em que são verbas da Segurança Social que estão a pagar os despejos feitos pela Câmara.
Nesse sentido, a CDU – Coligação Democrática Unitária da Cidade do Porto considera essencial que se analisem em pormenor as razões dos despejos efectuados por Rui Rio e pela coligação PSD/CDS, razão pela qual considera que a Comissão de despejos constituída por um representante de cada grupo municipal e presidida por um membro da Mesa da Assembleia Municipal e com reunião agendada para hoje analise toda a documentação e tramitação que fundamentaram os despejos de modo a conhecer as circunstâncias e os procedimentos adoptados. O atraso na análise dos documentos e consequente elaboração do relatório deve-se, entre outros factos, a entraves e dificuldades colocados ao seu funcionamento por recusa da Domus Social em entregar os elementos pedidos à Comissão, quer pelo claro boicote que a Vereadora da Habitação tem feito pelo facto de não disponibilizar as informações solicitadas.
Por outro lado, a CDU considera essencial, numa altura em que o Município procura recuperar os valores das dívidas acumuladas ao longo dos anos, que se proceda a uma definição das regras de pagamento dessas dívidas, por forma a garantir, num período evidente de crise económica e social, o seu efectivo pagamento, o que implica o perdão de juros de mora e de custas judiciais (se assim se justificar face ao débil poder económico das famílias) e a permissão do pagamento num período de tempo suficientemente longo para não representar um esforço demasiado elevado para as famílias (a experiência diz que não vale a pena estar a impor pagamentos elevados num curto período de tempo, dado que as famílias assinam esse plano de pagamento e, depois, não o conseguem cumprir). Nesse sentido, o Vereador da CDU irá apresentar, na próxima reunião da Câmara, uma proposta para dar resposta a esta preocupação.
Por último, é inadmissível que Rui Rio e a Coligação PSD/CDS continuem a basear-se no Decreto 35.106, de 6 de Novembro de 1945, decreto esse que é claramente inconstitucional, para instruir todos os processos de despejo, mesmo quando os contratos de arrendamento se baseiam em leis completamente diferentes. Este facto, que tem levado a acções de despejo em que os próprios inquilinos não são ouvidos pelos serviços da Câmara (tendo que recorrer aos Tribunais, após a efectivação do mesmo, muitas vezes com recurso a apoio judiciário, pelo facto de não terem dinheiro para pagar a um Advogado) é inadmissível. Razão pela qual o Grupo Parlamentar do PCP apresentou na Assembleia da República (depois de o ter feito na Legislatura anterior, sem sucesso), um projecto de Lei propondo a revogação desse decreto e transferindo a possibilidade de os Municípios procederem a despejos no âmbito dos Decretos-Lei 321-B/90 e 166/93 – o que impede regras discricionárias e baseadas em conceitos retrógrados datados e próprios da ditadura fascista (caso da possibilidade de despejo daqueles que não forem “bons chefes de família”) e, simultaneamente, dá aos inquilinos direitos de defesa antes da consumação do despejo.
A CDU considera que a atribuição de uma habitação municipal deve implicar, por parte daqueles que as usufruem, um comportamento de responsabilidade. Mas esse facto também deve exigir, da parte da Câmara, o respeito pelos direitos dos seus inquilinos, a assumpção de que o laxismo que durante anos norteou as relações da Câmara com os seus inquilinos não é da responsabilidade destes, a compreensão pelo facto de a grave situação económica e social que muitas das famílias estão a atravessar exigir medidas excepcionais e a adopção de uma postura de racionalidade na utilização dos dinheiros públicos, sejam eles administrados pelo Município ou pelo Governo (na certeza de que, em ambos os casos, são recursos pagos pelos Cidadãos).
Desse modo, a CDU – Coligação Democrática Unitária, ciente da responsabilidade que o conhecimento aprofundado da realidade dos bairros municipais da cidade lhe dá, tudo irá fazer para concretizar estas propostas que, sem dúvida, se inserem na sua política de contributo construtivo para a defesa dos interesses do Município e dos Munícipes.
Porto, 14 de Outubro de 2008
A CDU – Coligação Democrática Unitária
da Cidade do Porto