“O Futuro do Aeroporto”: Intervenção do Deputado da CDU Belmiro Magalhães na Assembleia Municipal
Intervenção, na Assembleia Municipal de 17 de Novembro, pelo deputado da CDU Belmiro Magalhães sobre as questões relacionadas com o futuro do Aeroporto do Porto.
Sobre esta questão fala-se muito e na verdade diz-se muito pouco. De certa forma, um pouco à semelhança da crise internacional, fazem-se correr rios de tinta, mas espremido, efectivamente são muito discretas as referências aos motivos reais da situação actual.
Em relação ao Aeroporto, são repetidos os apelos à mobilização daquilo que alguns chamam de “sociedade civil”, com o recurso exagerado a um pretenso tipo de regionalismo. Mas aquilo que precisamos na discussão de uma matéria tão delicada e importante como esta, é de rigor, por um lado, e de colocar antes de tudo o interesse da comunidade que representamos, por outro.
São conhecidas as intenções do Governo do PS de avançar no sentido da privatização da ANA, empresa responsável pela gestão dos aeroportos nacionais. Pensamos que esta é uma má opção, seja em que modelo for.
A ANA mantém desde a sua criação em 1979 uma elevada performance, com resultados positivos. Só na década de 90, a ANA realizou um volume global de investimentos de mais de 88 milhões de contos e obteve mais de 45 milhões de contos de resultados líquidos positivos. O volume de negócios ultrapassava os 50 milhões de contos por ano. A qualidade e eficácia do serviço verificado levaram a que o modelo da ANA tivesse sido inclusivamente, assumido por outros países europeus.
A ANA é uma empresa estratégica, com uma visão global em que se preocupa com todos. Se assim não fosse, seria difícil a manutenção de um aeroporto nos Açores, sempre a dar prejuízos, ou a realização de obras como as que se fizeram no aeroporto do Porto, estimadas em cerca de 400 milhões de euros e dos respectivos encargos financeiros. Esta realidade está a ser suportada pelos aeroportos de Lisboa e Faro. É uma das vantagens do sistema em rede.
A gestão privada do Aeroporto do Porto, seja feita por que investidor for, será sempre uma gestão orientada fundamentalmente para a maior rentabilidade possível, e não ver isto seria de uma ingenuidade imperdoável. Defender os interesses da nossa região, passa por defender uma gestão pública do Aeroporto. Defender os interesses na nossa região não é necessariamente defender grupos económicos com conveniências por estes lados!
Uma outra linha de argumentação daqueles que defendem a privatização do Aeroporto, é “que se trata de responder a um desafio que o Eng. Sócrates veio lançar ao Porto”.
Este argumento não presta para nada! Estaríamos muito mal se agora começasse-mos a aceitar todas as ideias deste Governo. Aonde é que íamos parar?
Outro argumento é que a privatização da ANA é uma inevitabilidade, que o que se trata agora é que arranjar um mal menor. A este argumento, respondemos que as gavetas dos ministros estão cheias de inevitabilidades que tardam em se realizar. Atentemos a um exemplo que todos conhecemos bem: as portagens nas SCUTS. A dinâmica reivindicativa popular foi de tal ordem, que forçou os autarcas e dirigentes locais do PS e PSD (partido pioneiro na defesa desta medida negativa) a exigirem a não colocação das portagens. E o facto é que o tempo vai passando, e as portagens não avançam … por mero cálculo político é evidente!
Quando se luta nem sempre se ganha, mas quando não se luta perde-se sempre!
O que se passa, obviamente, é que o Aeroporto é uma infra-estrutura com enormes potencialidades de rentabilidade, agora que o investimento pesado já foi feito com o dinheiro de todos nós, com o dinheiro dos contribuintes. Trata-se agora que entregar este verdadeiro “manjar” a grupos económicos … e com isso o PCP não pode estar de acordo.
Na revista “Porto Sempre” de Outubro de este ano, numa reportagem sobre o futuro do Aeroporto o assunto é referido como um “negócio”. Tal e qual!
O Plano Director do Aeroporto prevê uma capacidade de 15 milhões de passageiros/ ano. Actualmente, com as infra-estruturas existentes, a capacidade supera os 6 milhões.
Têm-se assistido ao aumento do nº de passageiros. O Aeroporto do Porto tem crescido a um ritmo superior ao ritmo nacional: em 2007 verificou um aumento de 17%, quando a média nacional foi 9,6%.
O Aeroporto do Porto prestigiou-se em termos de qualidade de serviços prestados, sendo classificado como o 3º melhor aeroporto da sua categoria.
Acrescentamos ainda uma outra preocupação. A gestão separada dos aeroportos contribuirá para uma espécie de “selecção natural” entre eles. A tendência poderá ser para haver por parte das companhias aérias uma preocupação maior com o aeroporto maior, no caso o de Lisboa, onde se concentram mais rotas e frequências, com consequentes prejuízos para os restantes aeroportos. Isto foi o que se verificou, por exemplo na Alemanha, em que o aeroporto de Frankfurt quase “secou” os restantes, e em França com o aeroporto Charles de Gaulle em que se verificaram as mesmas consequências.
Sem uma visão estratégica e global, tudo tende a concentrar-se no aeroporto principal, pelo que a autonomização dos aeroportos constitui um significativo risco.
Este paradigma de políticas económicas, em que o Estado privatiza as empresas lucrativas e estratégicas e mantém apenas as empresas com défices mas necessárias, tem que acabar! Olhemos à nossa volta, vejamos a situação em que a economia se encontra, e tenhamos a capacidade de reflectir e inflectir o rumo das políticas económicas.
Isto tem de acabar! Não se compreende que grandes empresas e lucrativas sejam privatizadas! Quando, por diversos mecanismos, os seus lucros poderiam ser utilizados em escolas, hospitais, transportes públicos, etc, são apropriados por grupos económicos, com o destino que estes entenderem mais adequado.
Algumas vozes do sector privado só querem o Estado para assumir as despesas e pretendem reservar para si a parte rentável da coisa. Esta atitude pode ser compreensível, agora, aquilo que não é aceitável que os decisores políticos se deixem levar neste “conto do vigário”.
Exmos Srs.
Já o dissemos nesta Assembleia, mas não demais reafirmar: ao Porto, como ao restante país real, nada será dado, tudo terá de ser conquistado!
A defesa da região passa pela luta, pela determinação, pela combatividade que as suas gentes e seus representantes depositarem na defesa das questões concretas que interessam de facto.
Isto não vai só de “conversa fiada”, é preciso ter a coragem de fazer rupturas e de afirmar as alternativas!
Disse!”