Análise do Relatório da Auditoria Efectuado à Empresa Municipal Porto Lazer
Na sequência da análise do Relatório da Auditoria à Porto Lazer, EM, elaborado pelo Gabinete de Auditoria e Controlo Interno da Câmara Municipal do Porto, a CDU – Coligação Democrática Unitária entende tornar pública a seguinte posição.
O relatório desta auditoria põe a nu um conjunto de irregularidades extremamente preocupante, tendo em conta que, sendo uma empresa “jovem”, deveria ter criado, desde o início, regras correctas de funcionamento.
Mas a gravidade da situação é ainda maior pelo facto de essas irregularidades não permitirem analisar as consequências que a adopção desses procedimentos teve para a salvaguarda do interesse público municipal.
Em particular, uma empresa que em quase dois anos angariou, para diversos eventos, 68 patrocínios, correspondendo a cerca de 2 milhões de euros, dos quais 56 não foram objecto de um contrato escrito, é um elemento extremamente preocupante, na medida em que, como diz o relatório, “facilita o surgimento de situações anómalas, tais como o não cumprimento integral ou parcial das obrigações das partes”. (página 42 do relatório)
Não obstante o reconhecimento público da gravidade desta situação, a Administração da Porto Lazer, na sequência da Auditoria, decidiu emitir uma directriz interna no sentido de se sujeitarem os patrocínios a contrato escrito, mas admitindo “situações de excepção” – procedimento completamente inadmissível! (página 44)
Mas, ao nível dos patrocínios importa dissecar outras situações relatadas no relatório:
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Qual é a situação do patrocínio, no valor de 86.382,12€, atribuído pelo El Corte Inglês e associado à aquisição de bilhetes para o espectáculo musical com os “Keane” e que, passado um ano, ainda não estava pago? (página 44)
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Porque não foram comparados, na Auditoria, os valores dos patrocínios e das contrapartidas obtidas pelas instituições que subscreveram contratos, de forma a analisar se os mesmos eram coerentes, ou seja, se para verbas semelhantes foram oferecidas contrapartidas semelhantes? (página 60)
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Como é possível que o Município do Porto aceite triangulações com empresas que surgem como patrocinadoras da Porto Lazer (no âmbito do Circuito da Boavista) e, ao mesmo tempo, como Mecenas da Câmara Municipal do Porto, num processo muito pouco claro e que indicia fuga à Lei do Mecenato e, consequentemente, o aproveitamento ilícito de vantagens fiscais? (página 58 a 60)
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Como é possível que não se tenham analisado os patrocínios do Circuito da Boavista que foram directamente angariados pela empresa Talento, nem o contrato feito com esta empresa, nem as contrapartidas que esta recebeu, nem os compromissos que não terão sido honrados (e que alegadamente, e no dizer da coligação PSD/CDS, levaram à rescisão do contrato)? (página 57 e Anexo 21)
Por outro lado, e ao contrário do que procuram fazer crer Rui Rio e a Administração da Porto Lazer, não é, apenas, a situação dos patrocínios que causa preocupação.
Ao nível dos Fornecimentos e Serviços Externos, os valores que constam da Auditoria causam bastante apreensão, pelos valores que apresentam e pelo facto de os mesmos não terem sido analisados pormenorizadamente pela Auditoria (pelo menos ao nível do relatório).
De facto, como é possível que em 2007 (ano do Circuito da Boavista) se tenham gasto 741 mil euros em sub-contratos (quando em metade de 2008 apenas foram gastos 2.800)? Ou em que é que se pagaram 1,04 milhões de euros em rendas e alugueres, quando em metade de 2008 apenas foram pagos 113 mil? Ou como é possível gastar mensalmente mais de 10 mil euros em despesas de representação? A quem são pagos honorários superiores a 883 mil euros em 21 meses (mais de 42 mil euros mensais)? Como é possível gastar, nesse mesmo período, 568 mil euros em Publicidade e Propaganda? Em que foram gastos 5,4 milhões de euros em trabalhos especializados? (Anexo 11)
São custos muito significativos, que representam, sempre, percentagens relevantes dos custos totais da empresa (entre 61% em 2006 e 76% em 2007) e que mereceriam uma análise mais aprofundada, quer quanto à forma como foram gastos, quer quanto à forma como foram adjudicados.
E esta necessidade coloca-se ainda com mais premência quando é a própria Auditoria que detecta o facto de, em material de escritório, ser normalmente consultada uma única empresa (à qual foram adjudicados cerca de 60% dos gastos totais em material de escritório), cujos preços praticados são, em média, cerca de 31,3% (!) superiores àqueles que são obtidos por intermédio da Plataforma de Compras Electrónicas da Câmara Municipal do Porto! (Página 37)
Outro facto que não abona em favor da transparência do relacionamento entre a Porto Lazer e a Câmara Municipal do Porto refere-se às diversas discrepâncias existentes entre os elementos apresentados por cada uma das duas instituições. Para além de as Contas da empresa relativas a 2006 nunca terem sido sujeitas à aprovação do Executivo, constatam-se diversos valores que são contabilizados numa instituição num ano e no ano seguinte na outra, aditamentos aos protocolos de cooperação que não são sujeitos à apreciação do Executivo (caso do Aditamento nº1 ao Contrato Programa para 2008) e valores aprovados pela Câmara que, sem qualquer satisfação, são posteriormente alterados (caso da transferência de verbas recepcionadas pela Câmara ao abrigo do Mecenato, em que o Executivo aprovou o valor de 880 mil euros e apenas foram transferidos 675 mil. (Páginas 22 e 23)
Também é incompreensível como é que, possuindo o Município do Porto uma empresa municipal vocacionada para a realização de obras públicas – a GOP – é a Porto Lazer a dirigir as obras de manutenção e reabilitação dos equipamentos que lhe estão atribuídos – com os diversos problemas decorrentes do incorrecto enquadramento legal das mesmas, bem como da sua ineficiência (páginas 38 e 39)
Relativamente aos Recursos Humanos, a análise do relatório da Auditoria permite constatar que, cada vez mais, a Porto Lazer contrata pessoal externamente, “devolvendo” à Câmara trabalhadores que pertencem ao seu quadro mas que estavam destacados/requisitados na empresa – o que faz com que o número de pessoas afectas ao Município venha a aumentar. Permitindo constatar que não há critérios na fixação dos valores da remuneração nem dos designados “subsídio de isenção de horário” e “abono para falhas”, a Auditoria (pelo menos ao nível do relatório) não procedeu à análise dos processos de recrutamento de pessoal, o que mantém a pertinência das dúvidas relativamente à transparência dos mesmos. Por outro lado, era importante alargar a análise desta situação até ao final de 2008, sendo certo que a CDU tem informações de que pessoal que estaria na Câmara em regime de avença (designadamente no Gabinete de Comunicação) foi contratado pela Porto Lazer, numa inadmissível tentativa de contornar a Lei (que, como se sabe, impede a manutenção dos “recibos verdes” ou, quando os serviços dos mesmos se tornem incontornáveis, exige a contratação de empresas por intermédio de concurso. (páginas 47 a 57 do relatório)
Por último, a análise das contas do Circuito da Boavista onde, notoriamente, a Auditoria não procedeu à análise aprofundada que se exigia. De facto, é o próprio relatório que diz:
“As verificações, em sede financeira, do Circuito da Boavista visaram determinar os custos e proveitos do evento e o resultado da sua realização. A natureza e os objectivos do presente trabalho não permitiram [sob pena de se prolongarem as verificações por vários meses, quando o trabalho em apreço não trata de uma auditoria financeira] aferir a materialidade, substância e forma das operações, antes traduziram-se por verificar a contabilização e a informação proporcionada pelo sistema contabilístico, presente situações de litígio que contendem com imputações de custos e de proveitos que não cabem aqui dirimir.”
Ou seja, as contas não foram validadas nem analisada a situação de litígio entre a Porto Lazer e a empresa Talento (subcontratada pela Câmara para a organização das corridas).
Face a esta situação, a análise das contas não é conclusiva, embora se possa apontar para o facto de as Corridas da Boavista terem custado ao erário público uma verba superior a 3 milhões de euros (2 milhões de comparticipação financeira do Estado, 320 mil euros de prejuízo coberto pelo Município, custos directamente incorridos pela Câmara e que não são apresentados nas contas – caso de amortizações de investimentos, limpeza, pessoal afecto – e outros custos da Porto Lazer que não foram imputados às corridas).
Este é um valor que importa ponderar, na medida em que gastar mais de 3 milhões de euros de dinheiros públicos em dois fins-de-semana, apesar do impacto que as corridas podem ter na animação e divulgação turística da Cidade, é manifestamente exagerado. Esta situação ganha ainda mais pertinência quando se constata, por exemplo, que este ano vai ser organizada a designada “Corrida dos Campeões”, no Estádio do Dragão, iniciativa que também contribui para a animação e divulgação turística da Cidade e que, tanto quanto se sabe, não vai representar qualquer custo para os cofres municipais.
Deste modo, e tendo em conta a apreciação que faz do relatório da Auditoria à Porto Lazer, a CDU irá propor, na reunião de amanhã da Câmara Municipal do Porto, as seguintes medidas:
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Esclarecimento sobre um conjunto de situações menos claras apontadas pela Auditoria (caso do patrocínio do El Corte Inglês ao concerto dos Keane, não aprovação das contas de 2006 por parte da Câmara, discrepâncias entre os valores do Mecenato aprovadas pela Câmara e efectivamente transferidas para a Porto Lazer, etc);
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Continuação dos trabalhos da Auditoria, abrangendo a totalidade do ano de 2008 (para ter dois anos completos de actividade da empresa);
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Realização de auditorias parcelares à situação dos Recursos Humanos (que tenha em conta os procedimentos adoptados em matéria de recrutamento, as contratações efectuadas no último quadrimestre de 2008 e as regalias auferidas pelos diversos funcionários, bem como os critérios que lhes estão subjacentes); à situação dos patrocínios, identificando as contrapartidas oferecidas para cada um deles (o facto de não haver contratos escritos não significa que não existem informações sobre essas contrapartidas); e aos Fornecimentos e Serviços Externos, identificando a totalidade das despesas efectuadas, as empresas que os prestam e as condições em que as mesmas são contratadas;
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Aprovação de uma directiva que imponha, sem quaisquer excepções, que os patrocínios de actividade municipal sejam objecto de um contrato escrito;
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Aprovação de uma directiva que retire à Porto Lazer a possibilidade de gestão directa de obras, passando essa responsabilidade para a GOP, empresa municipal;
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O envio do relatório para a Inspecção-Geral de Finanças para efeitos de apreciação das situações de mecenato e patrocínio atribuídas pelas mesmas instituições no âmbito das corridas da Boavista;
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Proceder a uma análise exaustiva às contas das Corridas da Boavista, identificando pormenorizadamente todos os custos incorridos pelas diversas entidades municipais que contribuíram para a sua realização.
A Conferência de Imprensa tem a presença de:
- Artur Ribeiro, membro da Assembleia Municipal do Porto
- Pedro Arcos, membro da Direcção da Organização da Cidade do Porto do PCP
- Rui Sá, Vereador da Câmara do Porto
Porto, 2 de Março de 2009
A CDU – Coligação Democrática Unitária / Cidade do Porto